20.9.07

Pazes no boteco

Não tinha glamour nenhum o local que ele tinha escolhido para tentar uma reaproximação. Não levava jeito para produzir encontros formidáveis, inesquecíveis e charmosos. Pelo menos, não na concepção mais tradicional a qual esses adjetivos aparecem mais constantemente associados.
Precisava de uma segunda chance com ela; tomara coragem e, naquela terça-feira de muito calor, acabou convencendo-a a tomar um suco num boteco ao lado da firma. Nada de luz de velas, nem de jazzinho tocando. As características que marcariam aquela conversa, sabia, deveriam nascer de seu discurso sincero, de seus sentimentos. Ah, havia também um cheiro de gordura no ar...e seria bem difícil que conseguissem esquecer dele um dia...
Assim que se sentaram, tomou ar e disparou a falar:
- Sabe de uma coisa? Errei com você! Quis me preservar demais, me resguardar demais e acabei envolto por uma muralha intransponível; muralha que eu mesmo ergui e que me prendeu longe de você, do seu amor, desse teu olhar doce, afetuoso! Acabei distante de tudo o que eu busquei por medo; medo de te magoar, de me magoar! Fui covarde e minha covardia me cobrou um preço alto demais: o de te ver longe, linda! Menina como sempre, mulher como nunca. Longe de mim mesmo nos momentos em que estamos mais próximos. E, sabe...me sinto como se tivesse roubado de mim mesmo a melhor chance que a vida me deu nos últimos tempos. Tempos difíceis, de uma busca incessante por algo que, talvez, tenha me sido oferecido sem que eu nem tivesse a sensibilidade de notar. Um amor puro. O teu amor...
Ela não sabia como reagir; a situação era inusitada demais e vê-lo ali, lutando para segurar uma lágrima que já lhe ia pelo meio da face partiu-lhe o coração. Sua mão delicada segurou o queixo daquele homem e, também tentando conter a emoção, disse:
- Sabe de uma coisa? Não vou deixar que um orgulho bobo me impeça de te olhar sorrindo todas as manhãs e de passar contigo as melhores noites da minha vida. Não quero que um sentimento menor me impeça de rir todas as vezes em que formos ao cinema e você acabar cochilando. Seria tolo da minha parte fingir que você não me disse tudo o que eu mais gostaria de ouvir; mesmo que com alguns meses de atraso. Não vou repetir o teu erro; não vou roubar nossa chance de encontrar, juntos, o que temos buscado, cada um do seu jeito, por tanto tempo...
Beijaram-se ali mesmo, no meio do botequim; ao lado de uma senhora que se atracava com uma empada enquanto dizia ao moleque-pedinte, habitué do lugar, que não; não estava interessada em comprar paçocas...

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