No momento em que a Suprema Corte americana discute o casamento igualitário; no momento em que o Brasil discute a (im)propriedade da presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias ter sido dada a um deputado que já deu declarações extremamente preconceituosas, um gesto que poderia ser prosaico ganhou repercussão semana passada: Daniela Mercury revelou que tem um novo amor. Uma mulher...
A cantora baiana anunciou, posteriormente, que comunicou o fato com a mesma naturalidade que já usou ao anunciar relacionamentos anteriores. A diferença: até então a artista, que ficou conhecida ao tornar popular a axé music, só havia assumido relacionamentos heterossexuais.
Desde o primeiro instante notei que a atitude de Daniela tinha um forte cunho político. São notórios seus compromissos com a diversidade e o combate a todas as formas de discriminação. Ao dizer-se apaixonada por uma mulher, a quem chama de esposa, a cantora deu mais uma demonstração do quanto é politizada. Mais tarde, voltou ao assunto ao criticar o deputado Marcos Feliciano, cuja eleição para a presidência da CNDHM colocou em cheque a própria comissão, além de demonstrar mais um litígio entre a sociedade civil e os rumos da política nacional.
Não é todo dia que uma artista do porte de Daniela Mercury se posiciona tão abertamente sobre um assunto que ainda é considerado tabu por boa parte da sociedade. O fato gerou grandes reportage
ns em jornais e sites. Foi notícia do Jornal Nacional, matéria do Fantástico e capa de Época e Veja. Todos perceberam a estreita relação entre o momento político - que não está restrito às fronteiras brasileiras - e a postura da cantora.
Ou quase todos...
Sim, quase, porque não tardou até que aparecessem aqueles que enxergaram no fato uma artimanha da cantora para voltar à mídia, para fazer sucesso. Achei estranho. Daniela Mercury é uma das cantoras brasileiras mais conhecidas no exterior atualmente. Estavam turnê em Portugal na semana passada, por exemplo. Já vendeu mais de 11 milhões de discos em todo o mundo. Foi a única artista brasileira convidada para a gravação do DVD de aniversário de 20 anos do Cirque de Soleil e parte da comemoração dos 25 anos do Festival de Jazz de Montreal. Nunca deixou de fazer shows e produzir seus próprios discos - forma de garantir sua independência artística. Muitas dessas produções, diga-se de passagem, receberam grandes elogios da crítica especializada. Destaco "Canibália", "Balé Mulato" e "Feijão com Arroz", entre os melhores CDs da cantora. Definitivamente, fracasso não é uma palavra que combine com Daniela Mercury. E, diante de tudo o que ela já conquistou e considerando o preconceito ainda tão forte em nossa sociedade, vejo que ela optou por correr riscos ao anunciar seu novo amor. Fez política, deu lição de humanidade e de coragem. Mas devo dizer que nada me surpreendeu: sou fã de Daniela há tempos e sei da inquietude da baiana que enxerga a arte como um grande poder transformador. Ao postar aquela bela montagem de fotos em p&b em que aparece com Malu, sua esposa, Daniela fez da vida real arte. E deu sua contribuição para transformar a todos nós...
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