11.4.12

Sobre a polêmica do aborto de fetos anencéfalos...

O Brasil acompanha - de modo menos interessado do que devia - o debate que envolve o julgamento do Supremo sobre a descriminalização do aborto de fetos anencéfalos. Quatro ministros do STF declararam hoje que votarão a favor do projeto que, caso aprovado, permitirá que pais e mães possam escolher como proceder em caso de gestação de um bebê sem cérebro - ou com comprometimento cerebral grave.
Tenho acompanhado as discussões pela mídia - e a TV é, de longe, a que menos tem se dedicado ao tema. Talvez para fugir de polêmicas com grupos religiosos e conservadores. Talvez por não reconhecer que essa seja uma temática de grande relevância. Vi apenas algumas discussões em programas como o Sem Censura e o Repórter Brasil, ambos da TV Brasil, e um debate no Entre Aspas, da Globonews.
Em todos os casos, fiquei surpreso com o nível de argumentação dos que são contrários ao projeto em discussão. Também me surpreende a total falta de sensibilidade à causa das mães que se deparam com um diagnóstico duro e decisivo: gerarão bebês com expectativa de vida limitadíssima. Bebês que podem existir por minutos, talvez horas.
Os que são contrários a descriminalização dos fetos anencéfalos se dizem a favor da vida. Também o sou. Totalmente. Mas fico penalizado ao imaginar que uma família pode ser obrigada a levar em frente uma gravidez que poderá terminar em morte sem que nada possa ser feito para diminuir, abreviar ou simplesmente evitar que tamanho sofrimento se torne ainda maior.
Não se trata de tornar o aborto de fetos anencéfalos uma obrigação. Seria contrário à ideia, caso fosse essa a proposta. Trata-se de oferecer aos familiares que atravessam esse momento tão delicado a possibilidade de escolher qual saída pode ser menos traumática. E só quem pode mensurar a dor que qualquer das escolhas vai ocasionar são aqueles que, de fato, vivenciam a angústia dessa decisão. Não acho justo que o Estado ou que as igrejas se arvorem no papel de defender uma vida para a qual virarão as costas em seguida. Ou alguma proposta e/ou dogma religioso prevê o acompanhamento psicológico para os familiares dos bebês anencéfalos depois que sua inevitável morte se consumar?
Alguns poderão dizer que há casos de crianças sem cérebro que conseguiram - e conseguem - viver por alguns anos. Sim, eu sei. Certamente são crianças amadas por seus pais. Mas também é certo que, infelizmente, elas representam uma exceção à regra. A maior parte jamais terá alta da maternidade.
Enquanto as TVs parecem negligenciar o debate - o que deve mudar nesta quarta, caso o STF chegue a uma conclusão - a Internet segue como tribuna livre. Hoje, no Twitter, os Trending Topics registraram algumas vezes expressões ligadas aos grupos que defendem que o abortamento de fetos anencéfalos deve continuar proibido por lei.
Felizes esses tempos de democracia. Mas sinto falta de argumentos menos "contaminados" por valores ligados à religião e mais sensíveis à delicadeza inerente à situação. Não se está falando de liberar o aborto. O que está em pauta é dar às mães e aos pais que vivenciam a situação a possibilidade de escolher de que forma melhor podem superá-la. 

Um comentário:

Lu Ribeiro disse...

Eu sou a favor da escolha! Nesse caso específico, acredito muito que existam famílias aptas a viver e superar esse drama e talvez até o bebê consiga viver mais do que o esperado, mas, como fica a estrutura emocional/psicológica da mãe depois de conviver por 9 meses com uma angústia constante? Alguns dirão que mesmo a gravidez aparentemente mais saudável pode se complicar no parto e nada pode impedir que a criança tenha algum problema genético apesar de todo o pré-natal ser perfeito. Mas nesse caso jogamos com 50% de chance de saúde. No caso dos fetos ancéfalos, não. E aí alguns dirão que eu sou pessimista ou perdi a fé. Nada disso. Acho apenas que cabe aos pais decidir.
O que mais me choca quando o assunto é liberação do aborto - em qualquer caso - é o tom usado pelos que são contrários a liberação. Como se o aborto ao ser liberado passasse a ser utilizado pelas mulheres como um anticoncepcional, uma pílula do dia seguinte. Como se fosse possível para uma mulher (com instinto maternal ou não) acordar pela amanhã, vestir sua melhor roupa e dizer: "ah, vou ali fazer um aborto". Em qualquer situação acredito que essa seja uma situação extremamente difícil e particular. Interromper uma gravidez é, muitas vezes, abortar sonhos e, em todos os casos, agredir o corpo. Espero que o bom senso sobreviva e seja concedido o direito de escolha. Sempre!