Sorrateiramente,
como quem não quer se deixar perceber, fecha o grande portão.
Guarda o molho de chaves no bolso e chama o elevador. Faz frio, o
vento é constante e sacode sua barba e a vasta cabeleira branca. Há
uma névoa seca e densa no ar. Enquanto espera, caminha de um lado
para o outro, cruza e descruza os braços, estala os dedos e faz todo
o possível para atenuar a ansiedade daquela espera.
Está
exausto. Não tirava férias há milênios e aquela “escapadinha”
seria providencial. Deu-se ao luxo de não pensar no destino dos
negócios, não queria se preocupar com nada. Cercou-se de todos os
cuidados para que seu destino não fosse descoberto e para que a sua
fuga, portanto, não pudesse ser evitada.
Foi
quando o elevador chegou. As portas se abriram e Gabriel, o
ascensorista, nada perguntou. Em muitos anos naquele posto, aprendera
que a discrição era um valor imprescindível: nada de olhares, nada
de perguntas, nada de conversa! Gabava-se, inclusive, de sequer
prestar atenção na fisionomia de seus passageiros. E não foram
poucas as vezes em que transportara gente famosa...
Poucos
instantes se passaram até que a porta se abriu. O calor que vinha lá
de fora assustou o passageiro, mas não chegou a surpreendê-lo. Saiu
do elevador e logo seus pés estavam sobre aquelas areias alvas,
escaldantes. A luz era abundante e o som das ondas batendo na
arrebentação soava como música em seus estressados ouvidos,
surpreendidos com aquela voz que não escutava há tempos...
- E
então você veio mesmo!
- Ãhn...sim,
sim! E agradeço-lhe pela gentileza. Como você sabe, eu...
- Não
precisa agradecer nada, meu camarada! Talvez você finalmente ser
convença de que aqui é bem melhor que...
- Por
favor, caríssimo! Não vamos começar a falar disso, certo?
- Está
bem, está bem! Bom, então venha comigo! Vou te mostrar que beleza
é isso aqui!
- Sim!
Está tudo muito bonito! Não venho aqui faz séculos...
- E
não sabe o que está perdendo! - disse o anfitrião, colocando o
braço tatuado em volta dos ombros do visitante e dando início a
uma animada conversa.
Era muita gente! Corpos bem
torneados, bronzeados, expostos ao sol e à toda beleza daquele verão
que parecia jamais ter fim. A paisagem também era perfeita para um
período de férias: céu azul, sem nuvens, mar calmo e verdinho,
coqueiros muito altos e uma brisa incessante – bem quente, é
verdade. Enquanto ouvia o que dizia o anfitrião, passou a observar
várias placas colocadas no início da faixa de areia. O local estava
muito bem sinalizado, pronto para receber turistas das mais variadas
procedências: Strand der Hölle, sinalizava uma.
Outras quatro indicavam, respectivamente: Παραλία
της Κόλασης, شاطئ
من الجحيم , חוף
הגיהנום e ساحل
جهنم.
Achou curiosa toda aquela diversidade de idiomas: Bãi
biển của địa ngục, नर्क
का समुद्र तट,
Plage de l'Enfer...parecia ter entrado numa
espécie de Babel litorânea, com línguas dos mais diversos tipos e
lugares! Strand van Hell, Hell's beach,
continuavam as placas, até que seu bronzeado guia anunciou:
- Chegamos,
meu Senhor! Seja bem-vindo às férias na praia!
PRAIA
DO INFERNO
continua
>>>
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